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Por várias ocasiões tenho visto na televisão elementos do Governo e os seus porta-vozes dizerem que as medidas e o cortes de salários e das pensões não são tomadas por prazer e com o intuito de sacrificar os portugueses.  Mas parece, porque a realidade tem-no confirmado.  

Veja-se o caso da saúde. Um médico do Serviço Nacional de Saúde confidenciou-me que os médicos estão a ser pressionados para não prescreverem exames de diagnóstico e de prevenção que, normalmente, as pessoas de mais idade necessitam com mais ou menos frequência para acompanhamento do seu estado de saúde. São passadas instruções rigorosas aos clínicos para que esse tipo de exames sejam apenas passados de dois em dois anos e já se fala de cinco em cinco anos. Recorde-se que há doenças silenciosas que não são diagnosticáveis porque os sintomas não ser percetíveis a não ser através de exames complementares de diagnóstico. Por outro lado, reduz-se a  prevenção e a deteção precoce de certas doenças que podem a vir tornar-se crónicas ou até provocar morte prematura.

Dizem os senhores do Ministério da Saúde que nada está a ser posto em causa, mas não é isso o que acontece. Através da comunicação social o Observatório Português dos Sistemas de Saúde, tem afirmado que "os estudos mostram que os idosos queixam-se de que sentem dificuldades económicas para comprar a totalidade dos medicamentos que lhes são prescritos e para fazerem uma alimentação saudável".

Não são apenas os idosos, como se sabe há cidadãos que não sendo idosos e encontrando-se no ativo necessitam de tratar ou prevenir algumas doenças. Trata-se de um problema de saúde nacional. Mas como é sabido este Governo não tem isso em conta nos seus planos para o país, se é que alguma vez os teve.

É tudo uma questão de fazer parecer em vez de ser.

Se pensarmos um pouco poderemos começar a desconfiar que, para além dos cortes e da redução das despesas com a saúde  existe uma agenda disfarçada em que o pressuposto vai no sentido de,  quanto mais idosos falecerem por falta de assistência médica, menos pensões e menos reformas a pagar e, assim, poupar. Utilizarão os senhores que atualmente governam este país o Serviço Nacional de Saúde quando têm necessidade de ir ao médico? Mesmo sem ter essa informação a resposta é obviamente não.

É tudo uma questão de fazer parecer em vez de ser.

Vejamos agora o caso de pessoas no ativo que, para se sentirem em boa forma para trabalhar em pleno, deveriam fazer periodicamente exames para o médico de família aferir a sua situação clínica que poderá ficar prejudicada caso não sejam feitos acrescido ao facto de algumas pessoas se queixarem de sintomas que eventualmente não sentem para obterem exames. Ah! A medicina no trabalho serve ! Pois!

Estas e muitas outras situações levam a que os de mais posses possam usufruir da medicina privada deixando o SNS para quem não as tem e onde, não lhes sendo facultados os cuidados de que necessitam estão fatalmente conduzidos para a doenças graves e até à morte precoce.  Se forem desempregados tanto melhor, são menos uns a quem não se tem que pagar subsídios. Mas dizem que não, que a assistência é igual para todos.

É tudo uma questão de fazer parecer em vez de o ser.

Penso que alguns se recordarão de José Sócrates que, durante a campanha eleitoral, acusava a direita neoliberal, ansiosa por captar o poder,  de ter em vista acabar com o Serviço Nacional de Saúde e criar uma saúde para pobres e outra para ricos. O que Sócrates antecipou é o que está a acontecer aos poucos. Apesar de cortes e mais cortes e dos enorme impostos que continuamos a pagar, cada vez menos usufruímos de quaisquer contrapartidas e os serviços pioram cada vez mais.

Se a ideia da direita neoliberal é a do princípio do utilizador pagador  então resta perguntar para servirá o pagamento de imposto se os cidadãos têm que pagar tudo.

É uma questão de ser e não de parecer.

Agora são os hospitais que vão voltar a pertencer à esfera da Misericórdias. Segundo o Jornal i,  o Ministério da Saúde pretende avançar com a transferência dos primeiros hospitais públicos para as Misericórdias já em novembro, garantiu à Lusa fonte da tutela. Um comentário de um anónimo afirma que "Desgraçados dos que não são da igreja (beatos) e políticos, pois a cunha vai implementar-se como serviço público...". A destruição do Serviço Nacional de Saúde continua.

As misericórdias tiveram o seu auge devido à pobreza que grassava pelo país em séculos anteriores as quais, posteriormente passaram também a superintender os hospitais. Hoje fala-se de exclusão social e de solidariedade, de desigualdades económicas e de processos de autoexclusão a que correspondiam no passado expressões como obras de misericórdia, caridade, beneficência, pobres, mendigos e vadios, pobres envergonhados, órfãs e desvalidos, presos pobres. Embora em contexto e realidades diferentes as palavras passaram a ter uma carga psicossocial menor mas os significados são idênticos.

Em 1971, ainda na altura do regime de Marcelo Caetano, o Decreto-Lei nº 471 reorganiza o Ministério da Saúde e Assistências como era então denominado e explicita o reconhecimento do direito à saúde de todos os portugueses, cabendo ao Estado assegurar esse direito, através de uma política unitária de saúde da responsabilidade do Ministério da Saúde, a integração de todas as atividades de saúde e assistência, com vista a tirar melhor rendimento dos recursos utilizados, e ainda a noção de planeamento central e de descentralização na execução, dinamizando-se os serviços locais. Surgem os “centros de saúde de primeira geração”. Em 1973 passa a existir o Ministério da Saúde é autonomizado face à Assistência e cria-se o Ministério dos Assuntos Sociais.

A política assistencialista que caracteriza esta direita que se encontra no Governo está paulatinamente a ir na direção  oposta conduzindo o Serviço Nacional de Saúde para o nível meramente assistencial e não a considerá-lo como um direito que deve assistir a todos os cidadãos sejam eles pobres ou ricos que pagam impostos e que mesmo assim têm que recorrer à saúde privada como até há muito não se verificava.

Dizem que não, mas  é tudo mais uma questão de parecer do que ser. 

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publicado às 19:15


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