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Comunicações e opiniões pessoais sobre o dia a dia da política e da sociedade. Partidos, demografia, envelhecimento, sociologia da família e dos costumes, migrações, desigualdades sociais e territoriais.
Não sou, nem fui no passado, apreciador da chamada canção nacional. Se bem me lembro al longo da vida devo ter ido, em circunstância excecional, uma ou duas vezes a uma casa de fados.
Correndo o risco de receber protestos, Amália Rodrigues, para mim nunca me disse nada. Foi uma cantora que levou um género de canção para fora de portas, assim como tantos outros cantores de outros países que também levaram para fora as suas canções. Não sou dos que diziam, em tempo, que Amália era a embaixadora do fascismo português no estrangeiro, e viam-na como propagandista do antigo regime. Também não é pelo facto de o Fado ter ficado na lista do Património Imaterial da UNESCO que vou passar a gostar.
Há quem queira, agora, ver o Fado como canção de mensagem e de brado da indignação, pleno de conteúdo social, contra a exploração capitalista opressora. O Fado sempre for social, pois é representativo do imaginário e do estado de espírito, em sentido restrito, do sentir do dia a dia do povo.
O que me trouxe até aqui foi um “post” publicado por Raquel Varela onde tece elogios aos fados de Ana Moura particularmente ao “Dia de Folga”. Raquel intelectualiza e carrega de conteúdo ideológico os fados daquela cantadora da canção nacional.
Onde está a admiração de Raquel Varela? A letra do fado que abaixo reproduzo é o relato do dia a dia da vivência das pessoas nos vários bairros populares e sociais. Quantas letras de fado contêm implícita ou explicitamente uma natureza social, basta ir ao portal do fado e procurar letras em que poderemos fazer leituras com caráter social e mais ou menos metafóricas.
Que dirá de Ana Moura, quando, algum dia, por questões comerciais e de público alvo, as letras de Ana Moura passarem a falar de touros, toureiros, touradas, pegas e pegadores dos ditos (espetáculo, triste, que eu também não aprecio)?
Se Raquel do cantar de Ana Moura e das letra dos seus fados está no seu direito. Não será por não apreciar fado que passarei a criticar ou a elogiar quanto venha desse género musical apenas porque tem, ou não, caráter filosófico e social implícito ou explícito.
Diz Raquel que “Há filosofia e política, dialética, dinâmica, estrutura e conjuntura, economia e sociedade, cultura e modo de vida nas letras dos fados da Ana Moura”, e mais, tem “amor e psicanálise”. Não vamos, cara Raquel, caracterizar o fado como marxista e não marxista consoante o ponto vista ideológico de cada um. Tudo na vida pode ter, e tem, uma base política, mas não exageremos.
Discordo muitas vezes das perspetivas e das análises de Raquel Varela, enquanto comentadora. Não será por isso que deixarei de gostar mais ou menos dela como historiadora e investigadora das questões sociais
Reproduzo de seguida a letra do fado cantado por Ana Moura.
Manhã na minha ruela, sol pela janela
O senhor jeitoso dá tréguas ao berbequim
O galo descansa, ri-se a criança
Hoje não há birras, a tudo diz que sim
O casal em guerra do segundo andar
Fez as pazes, está lá fora a namorar
Cada dia é um bico d’obra
Uma carga de trabalhos faz-nos falta renovar
Baterias, há razões de sobra
Para celebrarmos hoje com um fado que se empolga
É dia de folga!
Sem pressa de ar invencível, saia, saltos, rímel
Vou descer à rua, pode o trânsito parar
O guarda desfruta, a fiscal não multa
Passo e o turista, faz por não atrapalhar
Dona laura hoje vai ler o jornal
Na cozinha está o esposo de avental
Cada dia é um bico d’obra
Uma carga de trabalhos, faz-nos falta renovar
Baterias, há razões de sobra
Para celebrarmos hoje com um fado que se empolga
É dia de folga!
Folga de ser-se quem se é
E de fazer tudo porque tem que ser
Folga para ao menos uma vez
A vida ser como nos apetecer
Cada dia é um bico d’obra
Uma carga de trabalhos, faz-nos falta renovar
Baterias, há razões de sobra
Para a tristeza ir de volta e o fado celebrar
Cada dia é um bico d’obra
Uma carga de trabalhos, faz-nos falta renovar
Baterias, há razões de sobra
Para celebrarmos hoje com um fado que se empolga
É dia de folga
Este é o fado que se empolga
No dia de folga!
No dia de folga!
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