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Comunicações e opiniões pessoais sobre o dia a dia da política e da sociedade. Partidos, demografia, envelhecimento, sociologia da família e dos costumes, migrações, desigualdades sociais e territoriais.
O senhor primeiro-ministro Passos Coelho, no seu périplo propagandístico pelo país, acena com números e mais números, sempre positivos, claro, que as estatísticas vão deitando cá para fora. Eu sou um adepto fervoroso das estatísticas como indicadores sociais, económico e outros mais mas, daí tomar os números referentes ao país no seu todo como se eles correspondessem exatamente ao país real e às pessoas vai uma longa, longa distância.
Por sua vez o apoio descarado do senhor Presidente da República ao Governo de coligação PDS/CDS continua. Utilizando os mesmos chavões de Passos Coelho, ou será o inverso? Diz agora que “Precisamos de um Governo que tenha apoio maioritário na Assembleia da República” para o “cumprir as regras comunitárias, no que diz respeito ao controle do défice orçamental, sustentabilidade da dívida pública e também no que diz respeito às reformas necessárias para a competitividade da economia portuguesa.”.
Claro que o senhor Presidente não diz qual o partido ou partidos que devem constituir o tal apoio maioritário, mas a sua ideia, com certeza, deve ser uma maioria absoluta dos partidos que apoia para obter uma continuidade de acordo com as regras que indica. Isto é, prosseguir e agravar as políticas seguidas durante os últimos quatro anos. Pois então! Assim é que é!
Para bom entendedor meia palavra basta.
Mas, senhor Presidente, parece que foi durante este seu Governo, desculpe, durante este Governo que a dívida pública em percentagem do PIB passou de 96,2% em 2010 para os 130,2% em 2014.
Até parece que o senhor Presidente da República Cavaco Silva, e o seu primeiro-ministro Passos Coelho, estão ambos em propaganda eleitoral e em sintonia de objetivos. O primeiro-ministro, em vez fazer oposição às oposições, nomeadamente ao PS, deveria apresentar-nos um plano detalhado do que vai ser feito pelo seu Governo se por acaso ganhar as eleições. Ou será que já tem a certeza de que vai perder e já nem vale a pena apresentar qualquer programa de Governo?
O senhor primeiro-ministro com tanta coisa boa que diz estar a acontecer no país, e outras tantas que antecipa, mas que por cautela não promete, pretende convencer os portugueses, mas eles ainda não esqueceram o que no passado disse e o que fez depois e sabem o que lhes aconteceu. Por isso, já sabem tudo sobre trapalhadas, mentiras e promessas vãs e não querem que tal volte a acontecer apesar das palestras do tipo mestre-escola que faz ou possa vir a fazer.
No “post” anterior efetuei uma analogia entre o romance “A Náusea” de Jean Paul Sartre e a náusea que o governo de Passos Coelho provoca na maioria dos portugueses. Hoje vou abordar, no contexto da mesma analogia, outros aspetos mas específicos que provocam mais náusea do que angústia.
De acordo com o Jornal Público o primeiro-ministro afirmou no dia 13 de maio em Paris que o novo pacote de austeridade não se aplica e passo a citar “à generalidade das pessoas” e que “não têm consequências diretas para os cidadãos”. Não ficando por aqui continua e insiste, ao anunciar a dispensa de funcionários públicos e a contribuição especial sobre as pensões, que “não têm consequências diretas para os cidadãos”.
Qual é o objetivo daquelas afirmações a não ser o de dividir os portugueses para melhor conseguir os seus intentos que são o de destruir a economia, ao mesmo tempo que tem uma mão cheia de nada para a dinamizar. Talvez seja inspiração do ministro das finanças alemão que, como ele, desconhece por completo a cultura e a organização social de Portugal mas que elogia, sem hesitação, medidas que vão contribuindo cada vez mais para a nossa dependência e o descalabro económico e social.
Isto não provoca angústia, provoca náusea.
Analisando as afirmações de Passos Coelho não é difícil concluir que, para ele, os tais setores da sociedade que refere não fazer parte da generalidade das pessoas, passam de imediato a meros elementos de uma minoria, estigmatizando-os. É a evidência da verbalização de uma forma de pensar acamada numa ideologia simplista para quem o social é desprezável.
Isto não provoca angústia, provoca náusea.
Não nos digam que foi um lapso e que é um problema de comunicação, como alguns comentadores da propaganda do Governo pretendem fazer crer. O objetivo, por detrás daquelas afirmações, evidencia a miniaturização do Estado Social, fazer descer os salários, enclausurar o consumo das famílias, cortar na despesa pública sem critério, como se um país fosse governado por uma doméstica (com todo o respeito pelas domésticas) onde o corte na despesa não tem consequências sociais nem para terceiros.
Mas se as medidas se destinam, por agora, apenas aos tais cidadãos que “não fazem parte da generalidade das pessoas”, por experiência e pela história da evolução económica em Portugal nos últimos anos, a tendência será para que os que fazem parte da generalidade das pessoas sejam forçados a alinhar por contágio com a redução salarial e de direitos que, há muito, é ambicionada pelos proprietários e gestores de empresas dos vários setores de atividade.
Isto provocará angústia e náusea.
Passos Coelho ao compartimentar a sociedade não terá que combater tudo e todos ao mesmo tempo. Assim, a estratégia maquiavélica é a de dividir a população em minorias setoriais, culpabilizando-as sucessivamente e desconsiderando o facto de que, enquanto minorias, têm os mesmo direitos das maiorias porque são Homens e Mulheres, independentemente do seu enquadramento social e profissional. Para o primeiro-ministro o facto de um conjunto de sujeitos serem minorias por si só dispensa a necessidade de qualquer justificação. Formas de pensamento idênticas, na Europa do passado, deram lugar a várias perseguições.
Isto não provoca angústia, provoca náusea.
Em vez de se limitar a explicar as medidas de austeridade e a dizer, eventualmente, que não serão demasiado violentas ou contrárias à equidade, limitou-se a dizer que não se aplicam à generalidade das pessoas.
Isto não provoca angústia, provoca náusea.
Aponta minorias mencionando supostas benesses para provocar o ressentimento e inveja contra essas minorias. Recordo-me da estratégia contra os judeus no contexto político nazi.
Isto não provoca angústia, provoca náusea.
Arranja sucessivamente bodes expiatórios desde a Constituição da República até ao Tribunal Constitucional passando pela oposição e até parceiros sociais.
Passos, o seu Governo e alguns dos deputados que o apoiam selecionam um “target” (grupo-alvo) e apontam para ele privilégios. Com este propósito induzem outros grupos a olhar para o teto numa atitude de... Isto não é nada comigo! Mas não diz… preparem-se porque a vossa vez também chegará.
Isto não provoca angústia, provoca náusea.
Criando bodes expiatórios e dividindo os portugueses em grupos sociais e profissionais rivais tais como novos contra velhos, trabalhadores do privado contra os do público, pensionistas pobres contra pensionistas supostamente ricos, pobres e remediados contra ricos, torna-se muito mais fácil silenciar consciências, calcar valores para, consequentemente, poder dominar.
Sem querer estabelecer quaisquer comparações com outro contexto e noutras circunstâncias nos primórdios do terceiro Reich também começaram as perseguições a minorias e se viravam grupos da sociedade contra outros, acusando-os de serem privilegiados ou qualquer outra coisa que se inventasse para conseguirem os desígnios pretendidos.
Isto não provoca angústia. Provoca náusea, provoca desespero, provoca indignação, provoca revolta…
De acordo com um poema de Soares dos Passos, poeta ultrarromântico do séc. XIX da corrente pessimista,
“Vai alta a lua! na mansão da morte…”, deste nosso Portugal.
“Um gesto, um acontecimento no pequeno mundo colorido dos homens sempre é apenas relativamente absurdo: em relação às circunstâncias que o acompanham. Os discursos de um louco, por exemplo, são absurdos em relação à situação em que este se encontra, mas não em relação ao seu delírio. Mas eu, ainda agora, tive a experiência do absoluto: o absoluto ou o absurdo."
in A Náusea de Jean Paul Sartre
Imagem: Nausea de silent-arsonist
Não sou dos que avançam chavões e palavra de ordem como proposta de políticas alternativas que arriscam sem certezas das consequências pela sua realização. Mas factos são factos, e os números não enganam, embora alguns pretendam fazer ginástica com eles.
Quem está no Governo, quando os números não lhe agradam minimizam o facto, quando lhe agradam maximizam-no e até se trasvestem os números para que funcionem de acordo com os seus propósitos.
Concretizemos então através do que se diz e o que se faz. O Governo pretende convencer-nos, através de vários argumentos, que o Estado tem gasto mal o dinheiro dos nossos impostos divulgando então para a opinião pública que se deveria:
Isto é, eliminar as despesas desnecessária. O que se tem feito então é:
É certo que muitas das prestações sociais que existem ou existiam, por falta do controle, não se destinavam aos fins a que se propunham dando origem a abusos. Haveria também que efetuar alguns acertos em algumas prestações sociais, mas não com as justificações assentes em falácias. Como já referi, os argumentos lançados pelo Governo não coincidem com a realidade dos números mas deveriam coincidir.
Se atentarmos nos números divulgados pelo Eurostat e estes não coincidem com os do Governo então alguma coisa se passa. Ou os números enviados para o organismo da UE (União Europeia) que gere as estatísticas são falsos, ou o Governo mente ou ainda, ou o Eurostat é um poço de erros sendo a sua credibilidade posta em causa, o que não é provável. O mesmo se pode dizer dos números da OCDE.
Recordemos os números representados num gráfico que ontem coloquei num “post” deste blog.
Com a concretização das funções sociais, o Estado gasta menos que a generalidade dos países europeus. Com exceção da Noruega, Luxemburgo, Espanha e Suíça Portugal encontra-se na média Europeia. Como estes valores são favoráveis a Portugal o que acontece é que pretendem baixá-los de modo a serem colocados ao nível dos países que têm valores inferiores, isto é, recuar afastar-nos dos restantes países com o argumento de reduzir a despesa colocando Portugal ao nível dos países que saíram da alçada da ex-união soviética. Os que agora pretendem reduzir as despesas sociais na saúde e na educação são aqueles que, na naquela altura, acusavam (em alguns aspetos com razão) aqueles países de falta de liberdade económica e social que, por isso, estão na base da escala de despesas sociais.
De acordo com números do Eurostat publicados pela revista Visão em 2011 a despesa pública do Estado Português era de 48,9% do PIB e de 49,1% na União Europeia mas com uma taxa de desemprego maior e um nível de vida mais baixo. Entre os 17 membros da zona euro, havia em 2011 oito países onde a despesa pública foi maior, em percentagem do respetivo PIB do que em Portugal: França (55,9%), Finlândia (54%), Bélgica (53,3%), Eslovénia (50,9%), Áustria (50,5%), Grécia (50,1%), Holanda (50,1%) e Itália (49,9%).
Cabe perguntar então qual o objetivo da preocupação com a despesa pública? Por um lado é reduzir o défice até ao exigido pela EU e, por outro, o Governo pôr em prática o seu programa ideológico ultraliberal com a eliminação do estado social para o que pediu ajuda ao FMI, como é do conhecimento público, para a elaboração de um relatório que foi encomendado e, provavelmente pago, que lhe permita ter uma desculpa para a execução do pretendido.
Prova-se que não terão sido as despesas das Funções Socias do Estado responsáveis pela deterioração da economia e pela recessão. Em percentagem do PIB a EU tem uma despesa igual ou superior à de Portugal e que não foi por isso que deixaram de ter ou têm crescimento diminuto.
Sobre o que tem acontecido no passado o diagnóstico está feito, não temos que gastar saliva e tinta votando sempre ao mesmo. Cada partido que tem ocupado as rédeas do poder que faça o seu exame de consciência de acordo com a responsabilidade que a cada um compete.
A dívida pública entre 2000 e 2008 aproximava-se da Alemanha e da França, a partir de 2009 é que se verifica o descontrolo 83,2% do PIB, cujas causas já se conhecem. Aliás em 2000 era inferior àqueles países. Em 2011 já se encontrava em 108,1% conforme podemos verificar no gráfico seguinte.
Dívida Púbica em percentagem do PIB
Fonte: Eurostat
As previsões da dívida pública para 2013 são de 124%. A que se deve este aumento? Será devido às despesas sociais? Não é preciso ser especialista em finanças para fazer uma leitura das estatísticas e da informação disponível, assim, de acordo com o Banco de Portugal em 2012 Portugal irá pagar em juros 8,7 mil milhões de euros por ano ou seja cerca 23,8 milhões por dia. Basta fazer as contas.
O aumento da dívida pública é acrescida pela despesa com os juros dos empréstimos que aumentará e 2014 e, com a recessão, virá a ser superior a que o Estado gasta com o SNS (Serviço Nacional de Saúde).
Ainda temos o caso dos 4 mil milhões de euros que o Governo diz ter que arranjar, mas sem justificar qual o motivo e destino. Com tudo isto, estão já à vista o aumento da pobreza e das dificuldades sobretudo provindo da classe média e média baixa. Redução nos serviços de saúde, nas reformas e outras prestações que se prevê a médio prazo, baixar a esperança média de vida. Pode ser, afinal, uma das formas que encontra para reduzir a despesa com a saúde e, também pagando menos pensões. Por outro lado a destruição da coesão social irá conduzir a confrontos intergeracionais, entre trabalhadores de diversos setores nomeadamente entre público e privado e empregados contra desempregados.
Estratégias como o racionamento de medicamentos que põem em causa a saúde de pessoas que, sem ser por vontade própria como é óbvio tenham ou venham a ter doenças graves e prolongadas, cortes na educação e com o aumento de propinas incomportáveis no ensino superior, muitas famílias vão ser impossibilitadas, devido à austeridade, a impostos elevados e a cortes de salários, de ter os filhos nas universidades.
A competição por um posto de trabalho por qualquer salário que seja ou a sua manutenção vão gerar conflitos e consequentes fraturas na coesão social que tenderão a agravar-se a alargar-se. Basta consultar os dados da Pordata para se verificar que a taxa de risco de pobreza em Portugal antes das transferências sociais passou de 40,8% em 2005 para 42,5% em 2011. Sendo estimativas, e havendo muita pobreza envergonhada que não é manifesta, estas não mostram toda a dimensão do problema pelo que não se conhece qual o seu valor real. E ainda não se conhecem os dados de 2012! São as transferências sociais e de pensões que minimizam substancialmente estes valores, assim, as taxas de 2011, após transferências de pensões passam a 25,4% e, após transferências sociais passa a 18%. Com a redução substancial ou a sua eliminação como se comportariam as respetivas taxas? A ser isso um dos objetivos do governo, isto é, reduzir ainda mais aquelas transferências sociais o que poderá acontecer? Oxalá que não!
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