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Comunicações e opiniões pessoais sobre o dia a dia da política e da sociedade. Partidos, demografia, envelhecimento, sociologia da família e dos costumes, migrações, desigualdades sociais e territoriais.
PARTE II
A sobrevivência de um governo minoritário formado a partir do resultado de eleições depende, sobretudo, de apoios parlamentares, acordos, compromissos e eventuais consensos conseguidos por negociações e são várias as vantagens e as desvantagens de um governo deste tipo.
A democracia raramente é um regime de acordos, o seu objetivo é a convivência em condições muito marcadas por persistentes desacordos. Todavia os acordos são muito importantes pelo que, faz todo o sentido, investir neles, embora a discordância possa ser melhor do que um mau compromisso considerado como o resultado de uma negociação.
Foram estas premissas que deram seguimento ao que foi conseguido com a denominada “geringonça”, palavra lançada pelos desencantados com a perda do poder, pessimistas em relação ao futuro, devido ao acordo parlamentar alcançado por compromissos entre PS, PCP e BE tendo em vista a estabilidade política. Aquela designação face aos resultados conseguidos carece, atualmente, da eficácia do descrédito que, inicialmente, a direita pretendia.
É de presumir que as partes envolvidas sejam fiéis aos seus próprios princípios, mas defendê-las sem flexibilidade é condenar-se à estagnação. Em democracia não se consegue operar mudanças na realidade social sem algum tipo de cedência mútua, mas sem rejeitar a identidade ideológica de cada um. Foi assim que António Costa do PS, Jerónimo de Sousa do PCP e Catarina Martins do BE, ao longo da legislatura, souberam gerir muito bem e com eficácia, apesar de alguns contratempos, os compromissos assumidos sem que qualquer deles colocasse em segundo lugar os seus princípios programáticos e ideológicos.
Como não poderia deixar de ser os antagonismos estiveram em presença muitas das vezes mais encenados pela comunicação social do que a realidade manifestava. Democracia sem antagonismo não é democracia, embora algumas vozes vão dizendo por aí: “Eles não se entendem, por isso é que isto não anda para a frente”. A democracia não vive do unanimismo. Vive de contradições e antagonismos. Radicalizar o desacordo em política é o procedimento dos órgãos de informação para “dar nas vistas” e captar a atenção da sociedade.
Para a oposição de direita nem sempre o antagonismo e a dissensão parecem ser democraticamente saudáveis e não prestigiam a democracia. Quando se faz oposição apenas por princípio falha-se nos objetivos que levam a fazê-la. Em muitas ocasiões estar contra é um automatismo pouco imaginativo. Nesta situação o que está em jogo não é discutir assuntos objetivos, mas encenar diferenças para se manter ou conquistar o poder e chamar a atenção dos media, o que é nítido ao longo de uma legislatura e durante as campanhas eleitorais. Por outro lado, também quem detém a maioria nem sempre tem razão.
Para obter o favor da população as controvérsias públicas entre partidos em vez de diálogo têm mais de combate, espetáculo e dramatização do que debate argumentativo, comunicação e informação. Para se perceber o que está em jogo deve ter-se em conta que durante as controvérsias entre os opositores partidários não estão a falar entre eles, mas que estão a competir pela aprovação de um público a quem se dirigem.
Assim, numa sociedade deve haver um espaço para fazer política sem compromisso que deve ser conquistado e legitimado por eleições livres que deem maioria absoluta a um dado partido para poder governar.
Quando se fala em maioria absoluta não deixa de haver quem se oponha a uma tal possibilidade enunciando as suas desvantagens. Estes são os mesmos que, no caso de maiorias relativas a governar, despacham-se a dizer que não há estabilidade porque não há entendimento ou consenso entre duas ou mais forças partidárias para governar em coligação.
No caso português a maioria absoluta é definida como o número de deputados superior a mais do que metade do número total que compõe a Assembleia da República que é um parlamento unicameral composto por 230 Deputados eleitos por círculos plurinominais para mandatos de 4 anos. O partido que ganha a maioria dos mandatos forma o governo. Se um partido acaba com mais da metade dos assentos no Legislativo, forma-se um governo maioritário e tem o controle das decisões. Mas, se o partido que conquistar a maioria dos assentos tiver menos da metade do total de assentos, provavelmente formará um governo minoritário. Numa situação como esta o ambiente político torna-se mais volátil. Eu diria que a agenda e o programa do governo podem ficar mais estagnados.
Os partidos na oposição, tendo o maior número de deputados, podem impedir a aprovação de questões importantes como, por exemplo, o orçamento e podem apresentar moções de censura com o intuito de derrubar o governo.
Assim, resta que os votos dos portugueses incidam no que possa trazer estabilidade política, financeira e calma social o que não será fácil para um governo maioritário devido às potenciais contestações sociais disparadas pelos partidos na oposição. No caso de uma maioria relativa também não será melhor porque irá obrigar o governo a contactos negociais para acordos pontuais com os outros partidos e ficará sujeito a pressões várias o que pode colocar em causa a estratégia programática definida pelo partido que ficar a governar.
Não é por acaso que os partidos à direita e à esquerda do Partido Socialista, mesmo os que apoiaram no parlamento o Governo, incidem as suas campanhas eleitorais no sentido de, a todo o custo, evitar uma maioria absoluta do Partido Socialista de modo a que, caso ganhe as eleições com maioria relativa, possam capturá-lo para negociações exigindo contrapartidas. Nessas circunstâncias o partido do governo ficará refém, e com a liberdade de ação condicionada.
Em países como o nosso que adotam o sistema parlamentar de governo, a moção de censura (ou moção de desconfiança) é uma proposta parlamentar apresentada pela oposição com o propósito de derrotar ou constranger o governo. A moção é aprovada ou rejeitada por meio de votação (voto de censura ou voto de desconfiança).
É ainda importante, numa situação de governo minoritário, garantir que a sua base de apoio seja coberta por outros partidos que, apesar de estarem na oposição e, para o bem do país, estejam cientes das suas posições e responsabilidade enquanto partes interessadas. Porém, encontrar um alinhamento pode revelar-se difícil.
Muitas negociações podem ocorrer a portas fechadas, enquanto o governo tenta manter o poder. Nesta circunstância, muitas vezes observa-se que há uma agenda política por vezes difusa que pode refletir as negociações entre todos os partidos em vez de uma abordagem clara e evidente que se teria com um governo maioritário.
Esta situação de compromissos foi a verificada na legislatura que irá terminar com as eleições legislativas de outubro que resultou de negociações entre o Governo PS o PCP e o BE. Foi uma legislatura em que António Costa conseguiu, por vezes com negociações renhidas que pressionavam o Governo, manter a dita geringonça até ao fim.
O que o PCP e o BE pretendem é evitar na próxima legislatura uma maioria absoluta do Partido Socialista para o que já estão a trabalhar na campanha eleitoral à qual se junta também a direita com a finalidade de reduzir a sua margem de votos.
Sobretudo a direita, para o conseguir, tem recorrido a tudo quanto pode para desgastar António Costa e o seu governo. Os alvos têm sido vários, os transportes, a saúde, os hospitais, as maternidades, o SNS, até chegou a aliar-se ao PCP e BE na questão dos professores. Tendo em vista as eleições estas têm sido algumas das pontas que, com a ajuda dos órgãos de informação, agarrou para fazer campanha anti Governo.
Este tipo de “atitude carraça” da direita não vem de agora, começou com os enfermeiros e com a sua bastonária, que foi adjunta do Secretário de Estado da Saúde no XV Governo Constitucional de 2002 a 2004 com Durão Barroso. Ana Rita Cavaco militante e dirigente do PSD e bastonária da Ordem dos Enfermeiros, foi a cara da pior greve de sempre em Portugal. No seu currículo, deverá passar a constar, o cancelamento de duas mil cirurgias que não podem ser reprogramadas nos próximos anos.
Se a direita, no caso mais evidente o PSD, está a baixar nas intenções de votos nas sondagens a culpa não é apenas de Rui Rio como os seus adversários no interior do partido pretendem fazer acreditar. As causas remontam ao passado e à situação em que Passos Coelho deixou o partido e o país. O programa do PSD era na altura o programa acima da troika, que era o grande argumento para proceder a políticas neoliberais que então desencadeou.
Quanto ao CDS continua a defender um Estado que deve ser caritativo para pobres e em paralelo um setor privado para quem pode pagar porque não quer um Estado social, quer uma caridade estatizada. E veja-se a sua última proposta para o ensino superior segundo a qual quem não tiver nota para entrar na faculdade por causa da nota mínima possa pagar para poder entrar. Quem não tem dinheiro não entra!
Para fazer oposição a direita começou no início desta legislatura a acusar o Governo do PS de despesismo e de austeridade e lançou mão de discursos populistas e de suspeitas sobre uma fatura que viria no futuro. Era o velho discurso da suspeição que vinha de Passos Coelho. Agora inverteu o discurso e propõe o caminho do despesismo acusando o Governo de falta de investimento público em setores essenciais do Estado, como a saúde (no SNS), na educação, nos transportes, nos serviços públicos, mas omite que a causa foram os cortes que se fizeram nesses mesmos setores públicos quando a direita PSD+CDS foram governo, reclamando agora que tudo seja feito ao mesmo tempo.
Continua na PARTE III
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