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Comunicações e opiniões pessoais sobre o dia a dia da política e da sociedade. Partidos, demografia, envelhecimento, sociologia da família e dos costumes, migrações, desigualdades sociais e territoriais.
O discurso do Senhor Presidente da República no 10 de junho de 2013 merecia uma análise de conteúdo como aquele que elaborei quando da mensagem de natal de Passos Coelho. O trabalho seria em vão e trataria por ventura conclusões ainda mais tristes. Limito-me portanto a comentar.
Ao começar o seu discurso o Presidente Cavaco Silva referiu-se às fortificações da cidade de Elvas como símbolo da resistência ao adversário espanhol, contudo, esqueceu-se que deu cobertura à extinção do importante feriado que comemorava a Restauração da Independência de Portugal que esteve durante sessenta anos sob domínio dos Filipes de Espanha.
O Senhor Presidente da República faz-me lembrar um mágico de feira que, no palco da sua tenda, tenta distrair o público com ilusionismos cujos truques são mais do que conhecidos. Exibe a manga de um braço distraindo os olhares menos atentos para, com o outro, manipular o objeto do seu truque e, de seguida, tirar coelhos da cartola.
Aproveitou as comemorações para vir a terreiro mostrar as suas habilidades de “entertainer”, agora com o discurso do otimismo contra o pessimismo, da união entre os portugueses, da agricultura como jardim das maravilhas, com o pós-troika e, sobretudo, ao contrário de qualquer mágico, o Senhor Presidente veio relevar mais a sua pessoa auto elogiando-se e justificando-se.
Volta-se agora para a agricultura esquece-se do mar . Em 21 de outubro de 2010 afirmava a importância de "…abraçarmos novas causas, principalmente em momentos de crise. É vital desenvolvermos novas ideias de negócio, com vista a construir novas indústrias e serviços. O mar deve ser uma dessas ideias."
Em 21 de novembro de 2011 apelava para a necessidade de “olhar para o que esquecemos nas últimas décadas e ultrapassar os estigmas que nos afastaram do mar, da agricultura e até da indústria”. Ao falar de esquecimento, esqueceu-se que foi primeiro-ministro entre 1985 e 1995 e que surgiu nesses mandatos o problema do abandono daquelas atividades.
Nega agora a evidência e tenta “desfazer equívocos” sobre a destruição da agricultura e a perda da nossa capacidade produtiva naquele setor dizendo que “afirmar que a adesão de Portugal às Comunidades implicou a destruição d mundo rural e a perda irreversível da nossa capacidade produtiva no setor primário” é “completamente desfasado da realidade”.
Quanto ao pessimismo disse e passo a citar “Se há quem pretenda alimentar o pessimismo e contribuir para o desânimo dos portugueses, sentimentos que a nada conduzem, para isso não contarão comigo”. Esta afirmação apenas demonstra o total desconhecimento da realidade portuguesa nestes dois últimos anos. Não saberá este senhor presidente que o desânimo e o pessimismo que se instalaram nos portugueses, neste últimos dois anos, são da responsabilidade deste Governo e não de alguém em abstrato? Quererá, por acaso, o Senhor Presidente dizer que os portugueses andam pessimistas, descontentes e desanimados apenas e porque alguém lhes alimenta esses sentimentos? Ou, não será antes porque o Governo, que descaradamente tem apoiado, lhes cai em cima sem dó nem piedade sem quaisquer esperanças num futuro próximo, a não serem promessas virtuais, a um prazo que não se avista e em que já estaremos todos mortos?
Vai longe o tempo em que o Senhor Presidente avisava o Governo, a propósito das medidas de austeridade propostas pelo Orçamento de 2012, de que "Há limites ao sacrifício que se pode pedir às pessoas".
Numa retórica desproporcionada e desproporcional no tempo, faz apelo ao passado recordando a miséria que existia no tempo da ditadura há mais de sessenta anos (faz-nos lembrar César das Neves em alguns dos seus escritos), como se isso nos libertasse do pessimismo e desânimo. Isto apenas faz recordar os discursos ocos de Américo Tomaz numa altura em que, de facto, o Presidente a República era um pau-mandado.
Fazendo apelo à união dos portugueses esqueceu-se, mais uma vez, de que o grande causador da divisão dos portugueses é o Governo do qual é protetor. Afirmou numa entrevista à RTP1 que “não há desestruturação social” que dizem existir em Portugal, o que vai no sentido contrário ao que disse Silva Peneda no mesmo dia. Mais uma vez tenta passar falsas mensagens. Existe sim é uma falsa coesão, a ser gerida pelo desânimo e pelo medo das pessoas perderem o pouco que ainda têm. Ninguém sabe neste momento o que lhes pode acontecer. Ninguém sabe se ainda terá emprego na semana seguinte ou se lhe vão cortar no rendimento.
Coisa ainda mais estranha é que Cavaco Silva diz não querer ter qualquer nenhum papel político. Como se o papel de Presidente da República, eleito por sufrágio direto e universal não tivesse um papel político do mais alto nível. Não se percebe então o que é que tem andado a fazer!
Não há um tempo de “troika” e um tempo de pós-troika. Ao afirma-se que este programa que está a ser seguido é o programa do Governo é óbvio que se está a preparar também o pós-troika. Ou será que o programa que o Governo tem estado a seguir deixará de estar em vigor após a “troika” ter saído de Portugal, se sair!? O pós-troika não vai acontecer. Podem os elementos que a compõem deixar o país mas ela existirá pairando sobre as nossas cabeças via programa deste Governo se continuar e funções. Ainda muita coisa vai acontecer incluindo um novo resgate ou qualquer coisa idêntica com outra designação.
Tudo isto não é mais do que uma encapotada campanha pré-eleitoral de apoio ao Governo por parte da Presidência da República.
Pensando bem, ao reler os discursos do Presidente Cavaco e pelo que tem vindo a público nos últimos tempos, acho que sem qualquer pejo revela que tem vindo descaradamente a apoiar o Governo sem o distanciamento que lhe adviria do cargo de Presidente da República que deveria ser de todos os portugueses.
Imagem de: http://cidadedegente.blogspot.pt
1. Os porta-vozes dos partidos que apoiam o governo, esgotados os argumentos às críticas que fazem ao Governo e ao Primeiro-ministro, voltam-se agora novamente para o passado, único argumento que conseguem tirar da manga do casaco. Está já gasta a recuperação do como e do porquê chegámos até aqui. Basta! Já sabemos como se chegou até aqui. O que os portugueses mais querem é que nos tirem daqui e não nos prometam à custa de sacrifício e austeridade, quimeras e prosperidade num futuro que sabemos não chegará.
2. Tenho escrito várias vezes contra os comentadores políticos e contra os chamados líderes de opinião que defendem, no direito democrático de expressão do seu pensamento, alguns pontos de vista numa falsa perspetiva de a bem do país.
Encontram-se neste quadrante os que falam em nome dos que apelidam de sensatos porque não participam em manifestações, se encontram alheios ou ficam perplexos com o que se passa. Como supostos intérpretes dos pensamentos destes grandes grupos onde se dizem estar incluídos, apresentam alternativas em que a economia não seja o único critério para a governação devido à complexidade das relações sociais moderna. Neste último ponto estamos de acordo. O que parece ser duvidoso e me deixa perplexo a mim, e não sou dos que pensam que se devem deixar de cumprir os nosso compromissos, é quando afirmam que há necessidade de um consenso político que tenha como pano de fundo o memorando assinado com a “troika”.
Sugerem ainda que esse consenso deveria ser obtido através da ação presidencial. Não fica claro que tipo de consenso seria esse. De salvação nacional com todos os partidos? Não vejo isso como possível visto implicar a aceitação por todos das condições impostas que seguem a linha, segundo a qual o primeiro-ministro diz estar no bom caminho. Um consenso alargado entre os partidos do Governo e o Partido Socialista que deveria ser forçado pelo Presidente da República? Isto é, implicar e envolver o PS nas medidas que irão ser tomadas e, então, todos os portugueses descontentes iriam aderir e apoiar apenas porque muitos deles se calavam e passariam a sofrer em silêncio e deixar de encher as ruas com o seu clamor de protestos. Os senhores que apoiam este tipo de políticas são de facto líricos ou receiam o avanço eleitoral dos partidos mais radicais de esquerda.
3. Não nos podemos esquecer que o Presidente da República, em circunstância idênticas, na altura do anterior governo, do qual dizia-mos, e na altura com razão, estar fartos, tecia críticas em tons particularmente violentos ao ex-primeiro-ministro Sócrates que ajudou indiretamente a derrubar. Agora a sua orientação é outra. Fala de uma necessidade de “solidez e consistência da coligação governativa” do imperativo da “coesão nacional, que não se esgota na concertação social” e do “consenso político alargado com as diversas sensibilidades da sociedade portuguesa”. Atitude diferente da anterior. Como Presidente de todos os portugueses, facciosismo não lhe falta.
Em síntese a quem serviria um consenso alargado onde as políticas seriam mais ou menos as mesmas mas apoiadas por mais um partido?
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