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Fé, esperança e caridade

por Manuel_AR, em 31.10.13

O Governo, especificamente Passos Coelho, encontra-se no interior duma bolha que paira no céu, desligado da realidade, num êxtase de fé e de esperança apoiados pela mão do Presidente da República    

As intervenções e discursos do primeiro-ministro, Presidente da República e membros do Governo inspiraram-me desta vez para algumas incursões teológicas.

Fé, esperança e caridade são as virtudes teologais do Governo, complemento das virtudes cardeais que, segundo o catecismo da Igreja Católica, são a justiça, a fortaleza, a prudência e a temperança.

A fé, para os católicos é a primeira das virtudes teologais devido à qual se acredita nas verdades reveladas. No domínio da política pode ser a crença absoluta na veracidade de certo facto ou factos, tal e qual o que se passa com Passos Coelho ao acreditar que a austeridade pela austeridade e o empobrecimento do país é um virtude e uma verdade indiscutível que nos levará à redenção pelo crescimento económico.

A segunda virtude, a esperança, decorre da anterior. Os crentes no Governo e nas suas verdades indiscutíveis esperam confiantes, e com perseverança, pelas suas promessas e projetos destruidores realizados num espaço de tempo relativamente curto, lançando parte da população para o desespero e para o apelo à caridade.

A esperança que deveria conduzir à confiança levou  ao seu contrário devido à experiência de dois anos e meio de governação com a consequente perda de expectativas. A esperança é quebrada pela falta de confiança e pelo abuso da exploração das expectativas dos cidadãos não concretizadas. Lançando a hipótese de medidas lesivas para criar expectativas negativas para, passado pouco tempo, ao recuarem e ao desdizerem o que disseram, criam a ilusão de alívio da pressão criada por expectativas negativas anteriores.

A esperança é ainda apresentada como um aperitivo de crescimento e recuperação económica que trará a felicidade aos portugueses no pós troika (?) e será a substância das realidades que esperadas. Os portugueses devem acreditar num futuro melhor, qual fé que nos dará a felicidade eterna caso nos portemos bem. Por isso, os crentes neste governo acreditam nas falsas promessas e procuram conhecer e propagandear a suas verdades.

A intervenção de Pires de Lima no encerramento da reunião do séquito governamental PDS-CDS (jornadas parlamentares), com a sua liturgia própria, foi a constatação, através da fé e da esperança, de um milagre económico. Um autentico milagre económico aconteceu em Portugal, graças à fé das empresas acompanhada de preces. Acredita-se e eis o milagre.

Resta-nos agora a terceira virtude do Governo, a caridade através da perspetiva assistencialista. Caridade é um sentimento de ação e dedicação por outrem sem espera de recompensa.

Para poder praticar a caridade a igreja sempre careceu da pobreza, dos desvalidos e dos necessitados de alimento para o corpo e para o espírito como de pão para a boca, sem o que se perderia a justificação para amar o próximo. São Paulo disse na sua carta aos Coríntios que de todas as virtudes "a maior destas é o amor", condição para que haja caridade aliada à missão de sustento dos pobres e desvalidos. Sem as duas não existe caridade justificada. Dizia São Paulo, "se eu gastasse todos os meus bens no sustento dos pobres e até me fizesse escravo, para me gloriar, mas não tivesse amor, de nada aproveitaria". Podemos sintetizar que sem pobreza não podemos praticar o amor pleno pelo próximo.

Em termos laicos  caridade tem o significado de esmola, favor, benefício, bondade, compaixão. Não se pode negar ao Governo, através do seu Ministério da Segurança Social,  a virtude da prática intensiva da caridade, pois a operação tem sido a de transformar o Estado Social num Estado assistencialista, porta de entrada para a caridade e,  ao mesmo tempo, dá a oportunidade aos que ainda podem para praticarem o amor ao próximo, condição sine qua non  para que a caridade os conduza à salvação.

O assistencialismo privatizado ou semiprivatizado também custa caro, é pago com os nossos impostos porque alguém para o praticar tem que receber contrapartidas do Estado. Tira-se de um lado para colocar no outro. Sim, sabemos que muitas instituições vivem apenas com os contributos da sociedade para a suas práticas assistencialistas e caridosas. Não me refiro a esses cuja ação deve ser apoiada e louvada. O que se combate é a transformação de um Estado Social em que, através dos impostos todos contribuem para todos e ao qual todos possam aceder, num Estado assistencialista pago também com o dinheiro dos impostos sem vantagens para ninguém. Não é por acaso que os países do norte da Europa têm um forte Estado Social e nem pensam em acabar com ele embora alguns iluminados nos queiram fazer passar a ideia contrária.

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publicado às 19:42

Os manipuladores

por Manuel_AR, em 29.10.13

Em dicionários mais antigos não se encontra o sentido figurado de manipular a que atualmente se confere também o significado pejorativo de controlar ou influenciar indevidamente segundo os próprios interesses ou influenciar alguém levando-o a atuar de determinada forma.

O que os elementos que compõem o Governo têm feito ao longo dos dois anos e meio não é mais do que a manipulação do povo e da opinião pública. Não vamos mencionar os muitos exemplos que se encontrariam por aí, centremo-nos apenas nestes dois últimos dias.

Entre outros, o que me ocorre é o do atual Orçamento de Estado para 2014 onde, num primeiro momento, dizem que os cortes na função pública são para salários acima dos seiscentos euros, no momento seguinte, alguns dias depois, já dizem só para os de setecentos euros.

Por que razão este recuo? Se antes não havia, como diziam, plano B nem folga orçamental, como é que agora já têm alternativas para ir buscar as verbas que se perdem pela subida do limite do salários sujeitos a corte? Não deveria ter sido equacionado durante a preparação do orçamento?

Pode ver-se o objetivo que está por detrás desta súbita decisão do executivo de Passos Coelho, como já foi em outras ocasiões, minimizar os efeitos contestatários da função pública que se aproximam. Assim serão menos umas dezenas de milhar de funcionários que não aderem, pois o problema passa apenas a ser dos "outros", os que auferem salários acima dos seiscentos euros. É assim que este Governo sempre funcionou, manipulando e dividindo.

Outro caso é o das maravilhas dos crescimento que aí vem ao fim de algumas semanas, hoje também referido pelo Presidente da República. Algo de milagroso está para acontecer. Paulo Portas é hábil em pedir a intervenção do céu e do  sobrenatural, talvez seja por aí.

Passos Coelho, especialista em chantagem e na manipulação, mais do que especialista em governar o país, pede agora à oposição que o ajude a refazer o orçamento depois da negociação do Governo consigo próprio nas jornadas parlamentares conjuntas do PSD e do CDS-PP.  

Faltava agora Cavaco Silva vir para o palco dizer que "é bom que Portugal seja na Europa um país normal e o normal na Europa, de que nós fazemos parte, é os mandatos serem cumpridos". Pois é, o problema é que nós somos um país anormal. Na Europa, os Governos sabem governar bem os seus povos e defender os seus interesses e soberania apesar dos  problemas  pontuais que surgem normalmente em democracia. Não têm executivos incompetentes que pretendem destruir e desarticular todo um país que disfarçam com  a máscara de reformas estruturais.

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publicado às 17:05

Portugal Manual de Instruções, de Ricardo Costa,  é um livro de fácil leitura, bem escrito ao bom  estilo jornalístico que apresenta uma visão interpretativa séria, com algum esforço de isenção, mas, por vezes, pretensiosamente independente.

A clareza da linguagem oferece-nos um conjunto de factos relativos ao passado recente e ao presente da política portuguesa mesmo para aqueles que não gostam da complexidade da análise e do debate político feita apenas para alguns.

 

 

Apesar de se intitular um liberal, as suas convicções ideológicas e políticas não obstaram críticas à atual governação que confronta com a realidade portuguesa que se vive.

No essencial  não é um livro polémico mas, no que se refere aos passados governos de José Sócrates, desculpabiliza de algum modo a estratégia seguida pelo PSD para a tomada do poder, ao afirmar que o PEC IV ( e outros que se seguiriam, digo eu) não   iria resolver qualquer problema inclusive a vinda da troika. Poderia ter sido uma espécie de programa cautelar sem a austeridade violenta de um programa de ajustamento que Passos Coelho tanto ambicionava. Não se pode afirmar que o PEC IV não resultaria sem se ter em conta o estilo do antigo primeiro-ministro e as suas relações com o exterior no sentido de abertura de uma solução. Houve de facto um ataque ao poder desencadeado pelo atual primeiro-ministro e pelo PSD, apoiados pela esquerda radical, e isso pode ter sido o início da explosiva crise social e económica que estamos a viver.

As PPP's são um tema que diz servirem apenas "como armas de arremesso político" em vez de ser analisadas como "exemplos de erros políticos". São todos culpados, uns mais do que outros e há PPP's boas e outras más. Por seu lado, Cavaco Silva e o caso BPN e SLN são tratados com luvas brancas.

Ricardo Costa tece criticas sem exceção aos anteriores e atual governo, apontando no sentido de que as reformas estruturais tinham que ser tomadas e deverão continuar a ser tomadas, não esclarecendo como e quais, se bem que não seja esse o objetivo do livro. Não tece acusações é certo, mas vai apontando responsabilidades mais dirigidas ao passado, manifestando opinião favorável ao presente porque, para ele, nada vai ficar como dantes.

Para o autor a esquerda como alternativa ao poder não existe porque não se une, pelo que resta apenas a viabilidade  dum pacto entre PSD e PS. Nas entrelinhas podemos ler a forma como ele qualifica de AD a coligação PSD-CDS, como já houve no passado, e uma potencial aliança PS-PSD de bloco central, que também já houve no passado. Afinal parece que há sempre situações em que se pode voltar atrás!

Quem leia este livro não espere que tudo lhe irá agradar, quer sejam de direita quer sejam de esquerda.  Há que saber fazer as leituras convenientes sem quaisquer sectarismos político e ou partidário. Do meu ponto de vista não há independência absoluta no jornalismo e na interpretação dos factos políticos. Quem escreve sobre política acaba sempre por se denunciar mesmo que faça um esforço para ficar partidariamente equidistante. O tempo do todos e apenas a "Bem da Nação" já lá vai, para alguns com grande desgosto.

De qualquer modo é um livro com atualidade política cuja leitura não se deve fazer esperar.

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publicado às 17:49

 
  

Por várias ocasiões tenho visto na televisão elementos do Governo e os seus porta-vozes dizerem que as medidas e o cortes de salários e das pensões não são tomadas por prazer e com o intuito de sacrificar os portugueses.  Mas parece, porque a realidade tem-no confirmado.  

Veja-se o caso da saúde. Um médico do Serviço Nacional de Saúde confidenciou-me que os médicos estão a ser pressionados para não prescreverem exames de diagnóstico e de prevenção que, normalmente, as pessoas de mais idade necessitam com mais ou menos frequência para acompanhamento do seu estado de saúde. São passadas instruções rigorosas aos clínicos para que esse tipo de exames sejam apenas passados de dois em dois anos e já se fala de cinco em cinco anos. Recorde-se que há doenças silenciosas que não são diagnosticáveis porque os sintomas não ser percetíveis a não ser através de exames complementares de diagnóstico. Por outro lado, reduz-se a  prevenção e a deteção precoce de certas doenças que podem a vir tornar-se crónicas ou até provocar morte prematura.

Dizem os senhores do Ministério da Saúde que nada está a ser posto em causa, mas não é isso o que acontece. Através da comunicação social o Observatório Português dos Sistemas de Saúde, tem afirmado que "os estudos mostram que os idosos queixam-se de que sentem dificuldades económicas para comprar a totalidade dos medicamentos que lhes são prescritos e para fazerem uma alimentação saudável".

Não são apenas os idosos, como se sabe há cidadãos que não sendo idosos e encontrando-se no ativo necessitam de tratar ou prevenir algumas doenças. Trata-se de um problema de saúde nacional. Mas como é sabido este Governo não tem isso em conta nos seus planos para o país, se é que alguma vez os teve.

É tudo uma questão de fazer parecer em vez de ser.

Se pensarmos um pouco poderemos começar a desconfiar que, para além dos cortes e da redução das despesas com a saúde  existe uma agenda disfarçada em que o pressuposto vai no sentido de,  quanto mais idosos falecerem por falta de assistência médica, menos pensões e menos reformas a pagar e, assim, poupar. Utilizarão os senhores que atualmente governam este país o Serviço Nacional de Saúde quando têm necessidade de ir ao médico? Mesmo sem ter essa informação a resposta é obviamente não.

É tudo uma questão de fazer parecer em vez de ser.

Vejamos agora o caso de pessoas no ativo que, para se sentirem em boa forma para trabalhar em pleno, deveriam fazer periodicamente exames para o médico de família aferir a sua situação clínica que poderá ficar prejudicada caso não sejam feitos acrescido ao facto de algumas pessoas se queixarem de sintomas que eventualmente não sentem para obterem exames. Ah! A medicina no trabalho serve ! Pois!

Estas e muitas outras situações levam a que os de mais posses possam usufruir da medicina privada deixando o SNS para quem não as tem e onde, não lhes sendo facultados os cuidados de que necessitam estão fatalmente conduzidos para a doenças graves e até à morte precoce.  Se forem desempregados tanto melhor, são menos uns a quem não se tem que pagar subsídios. Mas dizem que não, que a assistência é igual para todos.

É tudo uma questão de fazer parecer em vez de o ser.

Penso que alguns se recordarão de José Sócrates que, durante a campanha eleitoral, acusava a direita neoliberal, ansiosa por captar o poder,  de ter em vista acabar com o Serviço Nacional de Saúde e criar uma saúde para pobres e outra para ricos. O que Sócrates antecipou é o que está a acontecer aos poucos. Apesar de cortes e mais cortes e dos enorme impostos que continuamos a pagar, cada vez menos usufruímos de quaisquer contrapartidas e os serviços pioram cada vez mais.

Se a ideia da direita neoliberal é a do princípio do utilizador pagador  então resta perguntar para servirá o pagamento de imposto se os cidadãos têm que pagar tudo.

É uma questão de ser e não de parecer.

Agora são os hospitais que vão voltar a pertencer à esfera da Misericórdias. Segundo o Jornal i,  o Ministério da Saúde pretende avançar com a transferência dos primeiros hospitais públicos para as Misericórdias já em novembro, garantiu à Lusa fonte da tutela. Um comentário de um anónimo afirma que "Desgraçados dos que não são da igreja (beatos) e políticos, pois a cunha vai implementar-se como serviço público...". A destruição do Serviço Nacional de Saúde continua.

As misericórdias tiveram o seu auge devido à pobreza que grassava pelo país em séculos anteriores as quais, posteriormente passaram também a superintender os hospitais. Hoje fala-se de exclusão social e de solidariedade, de desigualdades económicas e de processos de autoexclusão a que correspondiam no passado expressões como obras de misericórdia, caridade, beneficência, pobres, mendigos e vadios, pobres envergonhados, órfãs e desvalidos, presos pobres. Embora em contexto e realidades diferentes as palavras passaram a ter uma carga psicossocial menor mas os significados são idênticos.

Em 1971, ainda na altura do regime de Marcelo Caetano, o Decreto-Lei nº 471 reorganiza o Ministério da Saúde e Assistências como era então denominado e explicita o reconhecimento do direito à saúde de todos os portugueses, cabendo ao Estado assegurar esse direito, através de uma política unitária de saúde da responsabilidade do Ministério da Saúde, a integração de todas as atividades de saúde e assistência, com vista a tirar melhor rendimento dos recursos utilizados, e ainda a noção de planeamento central e de descentralização na execução, dinamizando-se os serviços locais. Surgem os “centros de saúde de primeira geração”. Em 1973 passa a existir o Ministério da Saúde é autonomizado face à Assistência e cria-se o Ministério dos Assuntos Sociais.

A política assistencialista que caracteriza esta direita que se encontra no Governo está paulatinamente a ir na direção  oposta conduzindo o Serviço Nacional de Saúde para o nível meramente assistencial e não a considerá-lo como um direito que deve assistir a todos os cidadãos sejam eles pobres ou ricos que pagam impostos e que mesmo assim têm que recorrer à saúde privada como até há muito não se verificava.

Dizem que não, mas  é tudo mais uma questão de parecer do que ser. 

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publicado às 19:15

Invisibilidade, transparência e opacidade

por Manuel_AR, em 21.10.13

A política, para Paulo Portas, "é mais parecer do que ser, fingir do que fazer, prometer do que executar". Qual homem invisível aparece e desaparece,  ajustando o seu campo lexical segundo as conveniências e olhando apenas para o eleitorado

 

 

O homem invisível é um livro de ficção científica escrito por H. G. Wells  onde o protagonista, um cientista que aplicou em si próprio uma substancia que o tornou invisível. A sua presença apenas se manifestava quando vestia uma roupagem e envolvia a cabeça com umas ligaduras e uns óculos escuros que possibilitassem a sua visibilidade.

 

 O significado figurado de invisível é o daquele ou daquela que se esconde ou que escapa à vista pela sua extrema pequenez. Há outra palavra que nada tem a ver com a invisibilidade e que é não visto, nunca visto, mas também tem o sentido de aborrecido, odiado.

 

A transparência, por sua vez, é atribuída a corpos que deixam atravessar a luz e deixam distinguir nitidamente os objetos colocados que se encontram na sua retaguarda. No sentido figurado é aquele que se deixa desvendar ou que se percebe facilmente, coisa clara, evidente.

 

Vem tudo isto a propósito das mensagens comunicativas dos membros do Governo que têm duas modalidades linguísticas, tomadas estas como categorias gramaticais que exprimem uma atitude do comunicador em relação ao seu próprio enunciado e ao seu interlocutor ou recetor. O Governo torna-se, assim, invisível pela falta de clareza no anúncio das medidas, translúcido e, por vezes, até opaco nas suas comunicações com os portugueses.

 

No caso dos membros do Governo, sendo estes os locutores/comunicadores, tomam, face aos seus interlocutores que são os portugueses e consoante os interesses, atitudes de invisibilidade comunicacional e raramente de transparência.

 

A invisibilidade comunicacional neste meu contexto refere-se ao aparecimento de ideias ou conceitos que, face às conveniências do momento, são lançadas para a opinião pública e, posteriormente, desaparecem do léxico do Governo para mais tarde voltarem a surgir. Veja-se, por exemplo, o caso da propaganda de  crescimento económico, tantas vezes lançado para a opinião pública, antes das eleições autárquicas, pelos membros do Governo, deputados da maioria e restantes comentadores da sua área política.

 

Agora, com o orçamento para 2014, essa ideia passou a uma espécie de invisibilidade lexical por parte do governo. Mas há mais. Face aos ataques da oposição e parceiros sociais  ao orçamento para 2014, retomam a velha tática da responsabilização do passado, já lá vão dois anos e meio, para vestirem as roupagens argumentativas daquele tempo tornando-as novamente visíveis face à inexplicabilidades de algumas medidas tomadas.

 

Tão depressa  uns temas aparecem e desaparecem nos partidos do Governo como outros temas aparecem para passado tempo desaparecerem novamente. A roupagem da visibilidade e temática e lexical argumentativa despe-se e veste-se conforme dá jeito, mas já só engana quem quer ser enganado ou quem tem uma fidelidade doentia aos partidos do Governo. A política, para Paulo Portas, é mais parecer do que ser, fingir do que fazer, prometer do que executar. Qual homem invisível aparece e desaparece ajustando o seu campo lexical segundo as conveniências e olhando apenas para o eleitorado.

 

Não é por acaso que, quer o primeiro-ministro, quer o seu ajudante, falam em tantos milhões de pensionistas e tantos milhões de trabalhadores do privado que valem mais do que pensionistas e trabalhadores da função pública. Para esta gente os portugueses são mera aritmética contabilística. Esperemos por meados do ano de 2014 para vermos o que vai acontecer com o setor privado quando, vendo que a receita passada a alguns não teve o efeito curativo pretendido. A nova receita será passada desta vez ao setor privado através de medidas retificativas. Neste país sem lei vale tudo. Apenas colocaram agora as ligaduras e os óculos escuros para mostraram o lugar do rosto.

 

Quando Eduardo Catroga afirma publicamente que o poder judicial se deve submeter ao poder político, está tudo dito. Ao que nós chegámos! Talvez seja influência do que se passa na República Popular da China onde isso acontece e cujo governo comprou parte da EDP.

 

O desespero é tal que já outros vêm em seu auxílio com comunicados que atingem até a nossa soberania, as nossas instituições democráticas e a nossa dignidade, enquanto povo  autónomo e independente, como o fez  a delegação da Comissão Europeia em Lisboa que preparou um "relatório político" "sobre a situação portuguesa, que se limita a ecoar as considerações críticas já efetuadas por outros responsáveis europeus acerca do impacto das decisões do Tribunal Constitucional na implementação do programa de ajustamento". Até o Presidente da Comissão Europeia, o Sr. Durão Barroso, se intromete na política interna. É bom que o povo português não se esqueça disto quando chegar a altura de ele vir para Portugal a ocupar um qualquer cargo que pensa lhe estará reservado.

 

Quanto à transparência, a falta dela é mais do que evidente. Podemos começar por Paulo Portas, o vice-primeiro-ministro, que começou a enfermar desta doença à semelhança do seu parceiro Passos Coelho. Paulo Portas disfarça a falta de transparência com truques retóricos mas que têm perna curta porque tudo se acaba por se saber. Sócrates já utilizava esse recurso semântico.

 

Recordemos o caso da conferência de imprensa onde Paulo Portas anunciou o resultado da oitava e nona avaliações da "troika", o caso das pensões de sobrevivência, a irrevogabilidade da sua demissão, etc.. Posteriormente, sobre as pensões de sobrevivência, vem esclarecer os que, segundo ele, distorceram o que tinha dito sobre o assunto. Afinal parece que, o que o disseram, veio a ser, na sua maior parte, posteriormente confirmado no parlamento pelo senhor secretário de Estado da Administração Pública que quer ficar na história como autor da reforma administrativa (qual reforma?). A falta de transparência do vice-primeiro-ministro começa a ser cada vez mais posta a descoberto, qual cheque careca.

 

A credibilidade deste executivo está franca e totalmente posta em causa pela sua invisibilidade, falta de transparência e opacidade. O ministro da economia vai tentando passar incólume, vamos ver se consegue e até quando. Será que as cervejas já deram o que tinham a dar ou também começaram a ficar turvas ?

 

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publicado às 14:10

 

 

  1. Já se sabia desde maio as medidas de austeridade, dizem eles, os do Governo. Sabia quem? O que se sabia eram apenas meras intenções baseadas numa carta de Passo Coelho à "troika". Esta maioria que os portugueses escolheram livremente para nos governar não têm o mínimo respeito por quem os lá colocou e, infelizmente, não foram apenas os  da sua área eleitoral. São omissos, troca tintas e mentirosos.
  2. Não há aumento de imposto para 2014 dizem. Para esta afirmação baseiam-se apenas em conceitos de termos fiscais. A verdade é que sobe os mais diversos nomes foram criados ou aumentados impostos mesmo que eles se chamem taxas, contribuições para o audiovisual, imposto automóvel, adicionais a aplicar a veículos e outros mais é como se fossem impostos. Seja pela despesa ou pela receita vai tudo vai tudo conduzir à quebra de rendimento dos cidadãos.
  3. A desigualdade na repartição de sacrifícios é enorme, 82% são cortes sobre salários e reformados, Saúde e educação e 4% taxas para banca, empresas petrolíferas e energia.
  4.  A estratégia de chico-espertismo do Governo  é apresentar algumas medidas como transitórias para "fintar" o Tribunal Constitucional", mas podemos todos ficar convencidos que ficarão para sempre.
  5. A eletricidade vai aumentar 2,8%, acima da inflação. Não é imposto mas vai reduzir rendimentos a juntar ao corte de pensões, reformas e nos salários. O aumento vai compensar imenso a taxa que vai incidir sobre as rendas das elétricas.  
  6. Descida do IRC é positiva. Quem irá pagar esta descida em termos de receita? Noutro momento seria uma decisão de descida fiscal, nesta altura é uma imoralidade, uma injustiça e uma perversidade. Duvido que a descida vá atrair investimento estrangeiro ou dinamizar o interno e, se algumas empresas aproveitarem d descida  não irá ter muito significado no emprego. Se não for regulamentado muitas empresas se irão aproveitar da descida em benefício próprio sem contrapartidas.
  7. Sou daqueles a quem se chama pessimista, derrotista e sem esperança no futuro pois antecipo que as previsões mais ou menos otimistas dos indicadores macroeconómicos do Governo vão falhar ou ser tão diminutos que não terão qualquer impacto na economia. Quase que posso "adivinhar" um crescimento económico residual, um maior aumento do desemprego do que o previsto,  uma retração no consumo e na produção e no investimento interno e, consequente, quebra de receitas fiscais e aumento da despesa social. Já não falo da instabilidade política e social. Daí até às ameaças pelos partidos do Governo de segundo resgate e de banca rota vai um passo.
  8. Pires de Lima, depois das críticas da APHORT - Associação Portuguesa de Hotelaria, Restauração e Turismo, justificar-se sobre a não descida do IVA da restauração dizendo que fez tudona defesa daquela medida mas que a "troika" foi inflexível e que no conselho de ministros defendeu aquela medida mas foi derrotado mas que cumpre o que foi decidido acima dele. Desculpas para ficar nas boas graças dos empresários. Sobre a questão sobre a descida do IVA da restauração sou muito cético porque é suposto à partida que não se iria sentir nos bolsos dos consumidores. Primeiro, porque os preços, como já tinha sido afirmado pelos empresários, não iriam baixar visto já terem margens muito baixas. Segundo, iria apenas ser vantajos para os empresários do setor. Terceiro, iria baixar a receita do Estado que teria que ir buscá-la a outro sítio, por sistema sempre os mesmos. Aliás Passo Coelho disse no programa o "País Pergunta" na RTP1 em 9 de outubro sobre a questão do IVA da restauração que, "o que se passa é que muitas pessoas, dada a sua quebra de rendimentos, deixaram de ter dinheiro para ir ao restaurante". Uma das poucas  verdades que disse. Saiu-lhe a boca para a verdade.
  9. Previsão do aumento da exportações. Ainda bem! Mas devemos ter em conta que parte substancial do que é produzido para exportar  teve de material importado o que, de certo modo, anula parte do valor exportado.
  10. As despesas em todos os ministérios sofrem cortes. Excetuam-se os Ministérios da Segurança Social, do CDS, mais 4,9% do que em 2013, Porque será? A Presidência do Conselho de Ministros  com mais 10,2%. Os mais prejudicados foram o Ministério da Economia com menos 35%   e o da Agricultura com menos 32%.
  11. Pelas declarações da Ministra das Finanças não existe qualquer indicador de segurança no que respeita a salários e pensões à mínima desvio na esquina poderá haver seguramente mais cortes. Por isso, cuidado com o consumo e despesas supérfluas. É melhor não gastar para precaver o que possa vir aí. Digo eu!
  12. Quanto ao privado digo o mesmo se houver derrapagem do défice e se a receita do orçamento não chegar  vão ter que ir buscar e muito onde ele estivar. Para este reitero o que disse no ponto anterior.
  13. Vai haver sempre PPP, BPN e outros calotes no final do ano que vão engrossar a conta. Quanto às PPP, segundo o Orçamento de Estado para 2014, vão aumentar em 52% os encargos do Estado a dos 869 milhões registados em 2013, isto é, vai ter que pagar 1645 milhões de euros em 2014.   
  14. Por último este Orçamento corta e aumenta sobre tudo o que mexe.  

 
Nota final popularucha: Passos Coelho, seus apoiantes e outros que para aí falam têm a sua vida e reformas chorudas garantidas quando saírem dos lugares que ocupam, por isso falam, como diz o povo, de barriga cheia. Quem ouvir Silva Peneda falar ao dizer que tem que haver roturas no tecido social com certeza que não lhe calha a ele!

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publicado às 23:20

A Fartura

por Manuel_AR, em 14.10.13

 

 

Qualquer dicionário apresenta mais do que um sinónimo para fartura. Em culinária é uma espécie é uma massa frita em espiral e polvilhada com canela e açúcar muito apreciada e normalmente vendida nas barracas das feiras. Outra tem o significado de abundância. Outra ainda é o de estar farto. Sim, é este tipo de fartura que os portugueses sentem quando os senhores do governo, mandatários,  correligionários, comentadores e afins, atrelados às ideias do governo, tentam passar para o povo um chorrilho de chavões amedrontadores para no dia seguinte desdizerem, por palavras confusas, o que anteriormente disseram.

Voltámos aos discursos  em que se aplicam à solta palavras como banca rota, perda de soberania, não há dinheiro para pagar ordenados na função pública, nem para pensões, os credores exigem, etc., etc..Tudo isto para se justificarem ao imporem condições gravosas, apenas para alguns, as medidas que tencionariam tomar mesmo sem "troika". Serve-lhes o discurso consoante a ocasião. É como a do segundo resgate. Num dia estamos à beira do segundo resgate, na semana seguinte nem pensar, não haverá segundo resgate.

A questão da banca rota é um chavão para amedrontar. Pensemos apenas no que aconteceria se tal acontecesse. A Europa do euro bem poderia começar a preparar-se para o pior. Vejam o que aconteceu com a Grécia, essa que estava já no patamar da total rotura financeira. Vieram todos a acudir para a salvar. Imaginem a possibilidade de caos que se geraria em que ninguém pagava ninguém...

Ser de direita não significa estar contra o estado social ou até optar por destruí-lo como este governo tem feito e se propõe continuar a fazer embora lance para a opinião pública a ideia de que não é assim. Estado Social e direita não são incompatíveis desde que se verifique desenvolvimento económico.

O mal não está na direita mas na conceção que a direita radical infiltrada no PSD que se encontra no governo, apoiada pelo CDS, com Passos Coelho como cabeça mandada, que tem o objetivo, não de fazer reformas inteligentes, mas  de destruir o Estado Social.

O que Passos Coelhos e o seu bando de terroristas sociais e incompetentes do  governo pretende é que a riqueza do país seja canalizada para uma elite económica e financeira que se pretende apropriar de grande parte das receitas do estado para benefício próprio. Esta é a direita com a qual se deve estar contra. Veja-se o caso da apetência pela saúde, caso dos seguros de saúde e pelas poupanças das contribuições para a reforma que em parte se prevê poderem vir a ser privatizadas.  

Esta não é, como se afirma,  a direita da liberdade de investimento, que cria postos de trabalho e riqueza e estimula a poupança . Esta é a direita do saque, do salve-se quem puder, que quer transformar Portugal num país sem lei, e sem rei nem roque, onde vale tudo. É a direita radical de odor totalitário que pretende até interferir na liberdade dos cidadão ao decidir quem deve ou não ter direito e define qual o valor com o qual acha que devem receber para viver. Veja-se o caso das pensões de sobrevivência. É um governo da direita radical que aplica o velho estilo soviético.

Este governo é uma instituição de venda a retalho de medidas anunciadas aos poucos e sem consistência que faz lançar para opinião pública parte de medidas gravosas para, depois, ao desdizê-las, poder afirmar que, afinal, não era bem assim... Não era tão mau como parecia. Vejam-se as declarações de Paulo Portas.

Para os portuguese este governo é uma FARTURA.

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publicado às 23:23

Injeção atrás da orelha

por Manuel_AR, em 11.10.13

 

 

Escrever politicamente correto não chega à maioria das pessoas. Por vezes há que chamar as coisas pelos seus nomes, sem disfarces que apenas servem para mascarar as realidades do se passa na política e nos condena a um suplício sem fim qual mito de Sísifo. Austeridade, mais austeridade, sacrifícios, mais sacrifícios, promessas em vão, austeridade, mais austeridade... num sem fim.

Agora começou a surgir nos debates políticos um ex-dirigente do CDS, José Ribeiro e Castro, da ala direita mais radical. Desta vez vem dizer que não existe austeridade mas sim rigor. Ao que chamará este senhor sacrifício? Prazer?

De acordo com o último programa prova dos nove da TVI24, para ele não está a haver austeridade mas sim rigor. É extraordinário como aquele senhor vem agora defender o indefensável com argumentos do passado, mais do que estafados, que grande parte dos portugueses já estão fartos de ouvir.

O primeiro-ministro depois das autárquicas anda agora em campanha pró-governo e está preocupado em "trilhar um caminho sustentável de crescimento e de prosperidade para todos os portugueses”. A palavra crescimento que é um vai e vem na gíria de Passos Coelho e do governo, volta novamente à baila a par da prosperidade que será num futuro tão longínquo que mal se vislumbra. Procura realizar por palavras e artes mágicas de comunicação, diga-se péssima, o que não consegue na realidade. A terra prometida do leite e do mel que ele promete é que tarda em aparecer com as políticas por ele impostas.

Para Passos Coelho o programa da "troika" já não é o do PSD mas deve ser nacional e, como tal, "não se trata apenas de escolhas de um Governo, nem sequer de uma coligação de partidos, mas de escolhas verdadeiramente nacionais". Assim, apela ao envolvimento do sistema na coesão político-constitucional, isto é, o envolvimento do Tribunal Constitucional com o Governo, o que significa que devem ser colocadas de parte as leis fundamentais do país, à boa maneira do terceiro-mundo, e de países que, apesar do seu grande crescimento, mantêm uma política repressiva, na prática destituída de direitos básicos. Para ele a coesão deve existir apenas entre o Tribunal Constitucional e o Governo.

A verdadeira coesão nacional, no seu todo, tem sido por ele destruída ao lançar a divisão entre grupos sociais e profissionais de portugueses na mesma medida em que lança outros para o empobrecimento, normalmente os mais frágeis, sem capacidade reivindicativa ou de qualquer forma de pressão. É um Governo cobarde que apenas desafia os mais fracos. Esta é a linha da insensibilidade social, escondida atrás dos memorandos da "troika", que é defendida pelo grupo que atualmente controla o PSD e que está no Governo

No mesmo envelope de Passos Coelho e do PSD podemos colocar Paulo Portas cujo cinismo e a falta de palavra foram já postos à prova. Analise-se com cuidado a conferência de imprensa dada por Paulo Portas sobre a oitava e nona avaliação da "troika" e os anúncios que se seguiram sobre a austeridade sempre sobre os mesmos. Um especialista em leitura da expressão facial detetaria um certo cinismo no sorriso ao anunciar, "nada", na referida conferência de imprensa.

Há uma linha política e social no PSD, adotada por este Governo que podemos designar por socio-terrorista, que se afasta da matriz essencial do partido, à qual me tenho referido em blogs anteriores,  que apostou no conflito inter-geracional e  na marginalização pelo afogamento económico e financeiro de determinados grupos sociais como pensionistas e reformados, alguns deles já fragilizados, numa espécie de eutanásia lenta.

 

 

Quem viveu os primeiros anos da revolução do 25 de abril ainda se deve recordar do medo que a direita muitas vezes aterrorizava os idosos, através da comunicação social, dizendo que o PCP e na União Soviética lhes davam injeções atrás da orelha para se verem livre deles. Ora bem, a estes indivíduos que nos desgovernam apenas falta a execução física e sumária dos idosos porque já arranjaram uma solução de eutanásia mais subtil que puseram em curso a encoberto da "troika" ao longo destes dois anos e meio.

Já várias vezes escrevi que há uma corja infiltrada no PSD, alguns uma geração de retornados, muitos deles provenientes de "jotas" radicais, selvagens, incultos, neonazis disfarçados, que controlam o partido, que se apresentam como grandes patriotas, e que, se não correrem com eles, destruirão e espoliarão Portugal até à medula na expectativa de benefícios pessoais na carreira política.

Já que se fala em retornados recordo o caso de Rui Machete que pôs em causa a nossa dignidade enquanto portugueses e a separação de poderes do nosso regime político e judicial. Isto não é Angola, a separação de poderes não está apenas no papel. Repare-se na defesa que alguns arautos do PSD e do Governo fazem das declarações de Rui Machete ao dizerem que foi em defesa dos interesses de Portugal e por causa dos investimentos de Angola. De Angola? De uma seita elitista de Angola talvez.

Claro que os jornais angolanos defendem Rui Machete e atacam Portugal. Afinal parece que o ministro dos negócios estrangeiros não está a defender os nossos interesses, mas sim os de Angola. Mas que raio de ministro dos negócios estrangeiros é este?

Alguém se recorda de algum ministro dos negócios estrangeiros, ao longo dos últimos trinta anos estar envolvido em escândalos para além de Paulo Portas, com a questão dos submarino, e agora este de Rui Machete?

 

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publicado às 19:26

Filme Blue Jasmin de Woody Allen

por Manuel_AR, em 05.10.13

Acho que tenho os meus próprios clichés. Um deles é a minha óbvia orientação urbana. Em todos os meus filmes, vemos pessoas a andar e a conversar nas ruas, a comer em restaurantes e a viver em apartamentos, Acho que há algumas questões e assuntos que se vão repetindo vezes sem conta nos meus filmes embora não em todos.

Conversas com Woody Allen, Eric Lax, Relógio d´Água, 2011

 

Desde a minha juventude que tenho visto a maior parte dos filmes de Woody Allen. Se para os críticos profissionais alguns deles foram uma desilusão para mim, enquanto espectador, não o foram.  

Como em quase todos os filmes, Woody Allen, com Blue Jasmin, continua na linha da neurose urbana consequência de conflitos interiores e reações defensivas derivados de eventos emocionais intensos de origem familiar, pessoal, social ou outros. Contudo, desta vez, sai fora dos parâmetros habituais dos seus anteriores filmes e passa a uma narrativa quebrada no espaço e no tempo conduzindo o espectador do presente para o passado através de flashbacks. Pára a ação do presente, revive o passado sem voltar ao momento da partida. São viagens cujo regresso não parou o presente. Retira-se de Nova York, a sua cidade de eleição, e transfere a personagem central para San Francisco na Califórnia.

O confronto entre dois mundos sociais fraturantes, o do passado e o do presente em que Jasmin passou a viver, são a causa da sua neurose e incapacidade de adaptação devido à mobilidade descendente na escala social e consequente mudança de convívios e interação na vida quotidiana.

Jasmin, nome adotado na alta sociedade em que vivia, protagonizado por Cate Blanchett, é um desenho sociológico da típica mulher socialite que vivendo na classe alta e devido à ruína do marido se encontra numa situação de dependência à qual não se adapta.

O falhanço dos cursos que queria tirar, a frustração num emprego, o assédio violento do patrão e a procura de uma nova relação que a faça regressar à abundância e ao luxo perdidos são as constantes em Jasmin sse enreda. Uma nova relação com um milionário, ocasionalmente encontrado numa festa, alicerçada em mentiras sobre a sua vida, é liminarmente desmascarada pelo ex-marido da irmã rompe a nova relação.

Este filme de Allen é  o retrato de uma sociedade em desequilíbrio de valores em que valoriza o “ter” e não o "ser". Quando o essencial é o ter a sua perda gera desequilíbrios emocionais e socias que conduzem ao isolamento comunicacional, consequências da neurose e da depressão. O retrato não é apenas o da sociedade americana mas de toda uma sociedade ocidental da burguesia que se desmorona.

Ansiedade, pesadelos e um colapso nervoso, são apenas alguns traumas que uma pessoa pode suportar antes de ir para a rua e começar a dialogar sozinha levando ao afastamento e olhares desconfiados dos passantes.  

Blue Jasmin é um filme inteligente, divertido, comovente e. sobretudo, preocupante.

Após ter visto o filme veio-me à ideia o caso Madoff e a maior fraude financeira de sempre que conduziu famílias à pobreza e à miséria. Como e porquê?  Vejam o filme!

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publicado às 17:19


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